Os mesmos grandes meios de comunicação da burguesia que há vinte anos comemoraram a queda do Muro de Berlim e dos governos revisionistas no Leste Europeu, o fim da história e da classe operária, agora, (na verdade há três anos), estampam manchetes sobre greves dos trabalhadores, passeatas estudantis, insurreições e a derrubada de governos pró-imperialistas em vários países.
Lembremos que desde 2008, o imperialismo sofre seguidas derrotas políticas na América Latina, o que o levou a reativar a 4ª Frota Naval e intensificar planos golpistas na região, como deixou claro o golpe militar de 28 de junho de 2009 em Honduras, que depôs o governo constitucional de Manuel Zelaya.
Em 2010, os trabalhadores e jovens foram diversas vezes às ruas contra a política dos capitalistas de jogar nas costas do povo o ônus da crise econômica, a maior desde a 2ª Guerra Mundial.
Na Grécia, ocorreram cinco greves gerais no último ano. Na França, 2,87 milhões de trabalhadores ocuparam as ruas contra a reforma da previdência e em defesa de empregos e salários. Na Espanha, com a adesão de mais de 70% da população, os trabalhadores pararam contra a redução do salário dos funcionários públicos.
Também organizaram greves gerais os trabalhadores da Irlanda, Portugal, Letônia, Lituânia, Polônia, República Checa, Romênia, Sérvia, Chipre, Itália, da África do Sul e de várias províncias da China. Em novembro, em Londres, Inglaterra, milhares de estudantes tomaram as ruas em protesto contra o aumento das mensalidades nas universidades e o corte das verbas para educação.
Nos EUA, apesar do silencio dos meios de comunicação, é cada vez maior o número de greves e mobilizações contra os cortes nos programas sociais e demissões de funcionários públicos. (Veja Estadunidenses na luta em www.averdade.org.br).
No final do ano passado, foi a vez dos povos africanos e árabes afirmarem que não estavam mais dispostos a viver sob o tacão de governos fascistas e corruptos e conviver com o desemprego e a pobreza em seus países.
Primeiro se levantou o povo tunisiano contra a ditadura de Ben Ali, que durante 23 anos e sob a proteção de sucessivos governos da França e dos EUA, promoveu assassinatos de opositores, encheu as cadeias de presos políticos, praticou gigantescas fraudes eleitorais e promoveu a maior corrupção da história da Tunísia.
Inspirados pela insurreição tunisiana, milhares de trabalhadores e estudantes egípcios promoveram gigantescos protestos contra o ditador Hosni Mubarak, há 30 anos no poder e importan-te aliado dos EUA na região. Mas como não há no mundo força maior que um povo em luta, o ditador egípcio teve que abandonar o poder. Foi um mês inteiro de passeatas, greves, manifestações e ocupações nas principais cidades do Egito
As revoltas populares na Tunísia e no Egito viraram um rastilho de pólvora que se espalhou por dezenas de países. Vigorosas manifestações clamam por mudanças em Bahrein, Marrocos, Líbia, Irã, Iraque, Jordânia, Arábia Saudita, Iêmen, Sudão e Argélia.
Na Líbia, a população assumiu o controle de várias cidades e impõe um cerco ao governo de Muammar Gaddafi. Este caiu em desgraça junto ao povo após abandonar os ideais do movimento que o levou ao poder, fazer acordos com as multinacionais do petróleo como a British Petroleum e a empresa francesa Total, apoiar a política externa dos EUA, e ser denunciado por enriquecimento ilícito de sua família.
Porém, no momento, a maior preocupação das potências imperialistas é com a situação da Arábia Saudita, país que detém 20% das reservas de petróleo do mundo e é o principal aliado dos EUA no Oriente Médio. Tanta é a preocupação que no dia 23 de fevereiro o rei Abdullah inter-rompeu seu tratamento de saúde em Nova York e retornou às pressas ao país para anunciar bene-fícios à população, bolsas de estudos no exterior e à previdência social, num valor total de 35 bilhões de dólares.
Não há, portanto, como deixar de reconhecer que o adormecimento deu lugar a um despertar de sonhos e de luta. A propaganda ideológica da burguesia de que o capitalismo traria a liberdade e o bem-estar para todos caiu por terra e bilhões de pessoas se conscientizam de que o paraíso capitalista não passa de um sonho numa noite de verão.
Sem dúvida. Quase 1 bilhão de pessoas que passam fome no mudo e 28% de todos os jovens trabalhadores do mundo vivem em situação de extrema pobreza. No Egito, 80% dos jovens estão desempregados e mais da metade da população vive na miséria. Já nos EUA, 50 milhões de pessoas vivem na pobreza e dois milhões de famílias foram despejadas de suas casas em 2010. Por todo o planeta, milhões de trabalhadores pobres não encontram emprego e formam verdadeiros exércitos de desempregados, em sua maioria composto de jovens.
Ao mesmo tempo, um minúsculo grupo de pessoas, a classe capitalista mundial, dona dos principais monopólios industriais, comerciais e dos bancos, não para de enriquecer. Nos últimos 12 meses, a fortuna dos dois homens mais ricos do mundo disparou: a de Carlos Slim, dono da America Mobil, cresceu US$ 18,5 bilhões e atingiu US$ 53,5 bilhões e, a de Bill Gates, dono da Microsoft, cresceu US$ 13 bilhões e chegou a 53 bilhões. Não bastasse, 35 instituições financeiras norte-ameri-canas (corretoras, bancos e empresas de seguro) apesar da crise, pagaram em 2010 US$ 150 bilhões em prêmios, bônus e compensações aos seus executivos. (WSJ,12/10/2010).
Assim, não resta outra alternativa aos povos senão a rebelião e a luta contra o desemprego, a pobreza, o alto custo de vida, a corrupção e falsas democracias.
No entanto, há que observar que muitas dessas revoltas não conquistaram profundas transformações econômicas e sociais.
No Egito, após a queda de Mubarak, uma junta militar formada por antigos servidores do ditador passou a governar o país e promete eleições, mas sob o controle de um Exército que recebe anualmente 1,3 bilhão de dólares do governo dos Estados Unidos.
Na Tunísia, o governo interino acoberta vários crimes e roubos da família do ditador Ben Ali e não adotou nenhuma medida mais profunda na economia do país.
É de se perguntar qual a razão de movimentos que derrotaram poderosas forças repressoras não conseguirem ir além de mudanças de governos.
A história da luta dos povos e da classe operária mostra a resposta.
Para o movimento de massas ser vitorioso não basta a indignação e a revolta popular; é preciso, antes de tudo, ser guiado por uma teoria revolucionária e dirigido por uma vanguarda organizada. Tal lição foi sintetizada por V.I. Lênin, grande líder da revolução socialista soviética de 1917, na frase “Sem teoria revolucionária não há movimento revolucionário”. É a teoria que dá segurança, orienta e guia o movimento para atingir seus objetivos mais profundos. Sem essa teoria revolucionária, o marxismo-leninismo, os movimentos terminam por se contentar com pequenas reformas e não conse-guem golpear com profundidade o inimigo nem atacar a verdadeira causa da opressão e da explo-ração: o sistema econômico, político e social.
Mais: o objetivo de todo movimento revolucionário, como mostra a história da humanidade, da revolta de Spártaco, passando pela revolução burguesa, pela Comuna de Paris até as revoluções socialistas, é transformar a sociedade, é pôr fim às ultrapassadas relações de produção existentes e estabelecer novas relações que impulsionem a sociedade para o progresso, a felicidade e a liberdade.
Logo, outra condição essencial para derrotar profundamente as classes exploradoras é que esse movimento revolucionário tenha uma vanguarda organizada, um destacamento avançado, que domine a teoria revolucionária e seja formado por combatentes com profundo vínculo com as massas populares e que trabalhe diuturnamente para elevar a consciência e o grau de organização da classe operária e do povo.
Faca amolada
O fato de vivermos um momento de grandes lutas e levantes populares, exatamente o momento que antecede a grandes transformações, torna ainda mais decisiva a tarefa de construir essa vanguarda, isto é, o partido comunista revolucionário, pois, como afirmou Manoel Lisboa, o fundador do PCR, “sem a ação da vanguarda, sem a direção de um Partido Comunista Revolucionário, a revolta do povo será sempre cega e inconseqüente.”
Nada disso, entretanto, diminui a importante vitória alcançada pelos trabalhadores e a juventude desses países. Pelo contrário, é graças a elas que acumulamos mais forças e que podemos sonhar mais alto e cantar os versos “Agora não pergunto mais pra onde vai a estrada. Agora não espero mais aquela madrugada. Vai ser, vai ser, vai ter de ser, vai ser faca amolada” de Milton Nascimento e Fernando Brant.
Luiz Falcão
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