Quando nosso partido tornou público o slogan “Sem ruptura, sem República, não há mudança”, ficou claro que nos referíamos principalmente à necessidade de acabar com a estrutura do poder político e econômico que tem como expressão jurídico-política o regime monárquico. Os “cidadanistas”, no entanto, insistiam que a vitória contra o PP só seria alcançada renunciando aos princípios, recorrendo à política “transversal”, sendo “o sorriso de um país”. E agora vemos as consequências: neste “segundo turno”, a alardeada “mudança” não pôde ser aplicada nem mesmo aos chefões que tanto preocuparam alguns no último ano.
Além disso, o resultado de 26 de junho apontou especialmente ao PP e, portanto, a Rajoy, pois ele não só aumentou em votos, mas em locais. Enquanto isso, o PSOE, apesar de não ter deixado a segunda posição, continua a cair e foi derrotado na Andaluzia, o feudo da principal rival interna de Sánchez, o que contribuirá para aumentar a confusão, as injúrias e os golpes por trás da trégua concedida por esse partido até passarem as eleições.
O velho bipartidarismo mantém seu domínio frente aos “novos” candidatos. É evidente que a direita retornou à disputa, e que nem as promessas de “regeneração”, nem os escândalos de corrupção são motivos suficientes para atrair eleitores. Também muitos seguidores do PSOE parecem ter abandonado a “nova política” para que não se repetisse o circo dos meses anteriores e jogar a Rajoy: assim, das análises dos dados de várias províncias se observa o deslocamento de determinado segmento de eleitores para a direita, e da “nova política” para a “velha” (de Podemos ao PSOE, de C’s – visto como menos conservador – ao PP); em Madri, por exemplo, os 29.000 votos obtidos pelo PSOE quase coincidem com os 27.000 perdidos pela UP comparados com os do Podemos, em 2015. Mas são as conclusões que a esquerda deve extrair sobre sua experiência que nos interessa aqui salientar, frente à luta que irão enfrentar os trabalhadores, as mulheres e a juventude no próximo período.
Embora alguns argumentem que a aliança de Podemos com a IU amedrontou certo número de seus eleitores mais moderados de 2015, o que é verdadeiramente relevante é que foi a esquerda quem engrossou a abstenção, que aumentou em mais de 1,15 milhões: em Madri, os 190.000 votos da IU não tiveram apenas impacto na UP, mas a abstenção aumentou em 160.000 eleitores; em Valência, a aliança de Podemos, Compromisso e EUPV perdeu 75.000 votos, e houve 47.000 novos abstenções; em Málaga, a abstenção aumentou em 34.000 cédulas e a UP perdeu 46.000 votos… E tudo isso acrescentando o fato de que em muitas dessas capitais o “cidadanismo” levou um ano demonstrando como governa.
Assim, longe das previsões das pesquisas, das declarações altissonantes e do enfoque falsamente ingênuo da propaganda que na verdade transmitia a ideia de “vale tudo”, a coalizão Unidos Podemos não tem sido capaz de iludir e galvanizar amplas massas que eles supostamente representavam. Pelo contrário, tudo aponta que a impressão do eleitorado de origem popular tem sido a de uma tentativa de “salvar os móveis” pelas organizações envolvidas, após a decepção de 20 de dezembro; ou, no pior dos casos, a de que alguns políticos muito parecidos com a “casta” e a “velha política” que supostamente vieram para enterrar. Mais de um milhão de votos perdidos testemunham isso.
Provavelmente, os líderes recorrerão aos conhecidos pretextos: o recurso do “voto útil”, a “campanha do medo” e as calúnias de certos meios de comunicação, os defeitos na comunicação ou mesmo, como assinalávamos, terem caído na identificação com a esquerda, de que sempre se esquivaram os “cidadanistas”. Mas nenhuma desculpa é capaz de esconder que são precisamente suas vacilações que terminaram passando recibo a Unidos Podemos.
É verdade que tem havido progressos em certo grau de unidade de certa esquerda; é verdade, também, que se conseguiu criar certo entusiasmo com a possibilidade de lançar o PP e superar o PSOE. Mas essas “conquistas” são totalmente irrelevantes contra o fato de que eles preferiram permanecer como simples “braço esquerdo” do regime, em vez de levantar uma alternativa política geral diante dele para subverter a correlação de forças entre a oligarquia e as classes populares. Sob o pretexto de “mudança”, sob a ladainha populista de “transversalidade”, se sacrificou o programa de transformação que – não pode ser de outro modo – tem o seu eixo central na República Democrática, Popular e Federativa.
Mas não só isso: das ambições eleitorais da pequena burguesia ao voto volátil “de centro”, têm sido sacrificadas também a mobilização e organização de nossa classe, imprescindíveis para continuar a luta que exigiria qualquer alternativa política que reivindique seriamente a transformação das estruturas sociais e políticas em um sentido democrático e popular. E, depois de tantas renúncias, não só não conseguiram estender sua base eleitoral, senão precisamente por causa delas caíram com toda a equipe.
Portanto, os trabalhadores e os povos de Espanha devem exigir responsabilidades aos líderes que os têm paralisado com seus cantos de sereia e aos que têm vacilado nos princípios para buscar seu lugar ao sol. Fica claro, portanto, que os princípios não se vendem e que, na esquerda, a política de atrelamento não ganha. Que sobre as renúncias só se constrói a frustração. Que o inimigo não se derrota em seu próprio campo de jogo.
As eleições não significam que a direita seja hegemônica, mas sim que as renúncias da esquerda nos levam à derrota política, e não apenas no campo eleitoral. A mesma classe operária intui que sem ruptura não há mudança e que de nada serve uma “unidade” por cima; precisamos de uma unidade que envolva, mobilize e organize amplos setores populares. E precisamos urgentemente: embora existam múltiplos fatores que irão afetar imediatamente a política da União Europeia (turbulências financeiras, consequências políticas da Brexit, mobilização operária na França…), Bruxelas retomará, mais rápido que se pense, suas exigências de novos recortes sociais, que incluem restrições às liberdades políticas, como já vimos. Frente a isso, a tarefa prioritária da esquerda é fortalecer a organização e os objetivos da unidade popular.
Antes de 19 de junho, aniversário da abdicação expressa de Bourbon nomeada por Franco, várias organizações acordaram um programa comum de oito pontos para a ruptura com o regime monárquico e pela República; um programa para articular a unidade popular e a unidade da esquerda. Esse é o caminho: reagrupar e reconstruir política e organizativamente a esquerda, vencer a frustração e passar à ofensiva. Os trabalhadores e os povos não podem ser quem carregue as consequências das renúncias de seus “líderes”, entre outras coisas porque a desmoralização da nossa classe significaria abrir o caminho para o fascismo. O fracasso das promessas do oportunismo deve servir para retomar com forças redobradas o processo que o “cidadanismo” cerceou em 2014: a construção de uma alternativa geral ao regime com base num projeto de ruptura republicana, na organização de nossa classe e na mobilização popular com objetivos políticos. Por isso seguiremos trabalhando os comunistas, com firmeza, sem renúncias.
Viva a unidade popular! Pela república, rumo ao socialismo!
Partido Comunista da Espanha (Marxista-Leninista) – Secretariado do Comitê Central – 27 de junho de 2016 – PCE(ML) Outubro – Órgão do PCE(ML)
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